Cidades identificadas pelo LiDAR na Amazônia equatoriana |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista, conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
A descoberta de um enorme e milenar complexo citadino na Amazônia muda o que sabemos sobre a história dos povos que vivem na região.
Com efeito, uma expedição de arqueólogos do prestigioso Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS) da França encontrou um conjunto de cidades perdidas há 2.500 anos na floresta amazônica do Equador, escreveu “La Nación”.
Esses locais que abrigavam milhares de pessoas faziam parte de uma densa rede de assentamentos e rotas de comunicação, aninhados nas montanhas arborizadas da Cordilheira dos Andes.
Stéphen Rostain, o arqueólogo que liderou a investigação, começou a escavar no Vale Upano há quase 30 anos. Sua equipe se concentrou nos grandes assentamentos de Sangay e Kilamope.
Ali encontraram montículos organizados em torno de praças centrais, cerâmicas decoradas com tinta e linhas incisas e grandes potes contendo restos da cerveja de milho ou chicha.
Datações de radiocarbono mostraram que os locais de Upano foram ocupados por volta de 500 AC. até entre 300 e 600 DC.
Stéphen Rostain o arqueólogo que liderou a investigação |
A equipe identificou cinco assentamentos grandes e dez menores em 300 quilômetros quadrados no Vale Upano, cada um densamente povoado com estruturas residenciais e cerimoniais.
As casas e praças estavam ligadas por uma incrível rede de estradas e canais. A área fica à sombra de um vulcão que criou solos ricos, mas também pode ter levado à destruição da sociedade.
As cidades estão intercaladas com campos agrícolas retangulares e rodeadas por terraços nas encostas. Neles os habitantes desenvolveram plantações que incluíam milho, mandioca e batata doce, encontradas em escavações anteriores.
Estradas largas e retas ligavam as cidades entre si, e as ruas passavam entre as casas e os bairros dentro de cada povoado. “Estamos falando de planejamento urbano”, disse Fernando Mejía, arqueólogo da Pontifícia Universidade Católica do Equador.
“Embora seja difícil estimar a população, o local abrigava pelo menos 10 mil habitantes e talvez até 15 mil ou 30 mil no seu auge”, disse o arqueólogo Antoine Dorison, coautor do estudo do mesmo instituto francês.
Esses números são comparáveis à população estimada de Londres na era romana, que era a cidade mais populosa da Grã-Bretanha dessa época, e era coetânea das cidades amazônicas agora achadas.
“Isso mostra uma ocupação muito densa e uma sociedade extremamente complicada”, disse Michael Heckenberger, arqueólogo da Universidade da Flórida, que não esteve envolvido no estudo.
A rede urbana descoberta alinha-se estreitamente com outras em locais que foram encontrados nas florestas tropicais |
Iriarte, que não participou da pesquisa, comentou: “Os incas e os maias construíam com pedras, mas o povo da Amazônia geralmente não tinha pedras disponíveis, então usavam barro. Ainda assim é uma quantidade imensa de trabalho”.
Os cientistas também encontraram evidências de sociedades intrincadas na floresta tropical em outros locais da Amazônia, notadamente na Bolívia e no Brasil, que antecederam o contacto europeu.
“Sempre houve uma diversidade incrível de pessoas e assentamentos na Amazônia, não apenas na forma de vida”, disse Rostain.
Conheciam-se cidades em elevações dos Andes, como Machu Picchu no Peru, mas acreditava-se que na Amazônia as pessoas viviam apenas de forma nômade ou em pequenos assentamentos, observou “La Nación”. Essa crença se revelou falha.
“Isso muda a forma como vemos as culturas amazônicas. A maioria das pessoas imagina pequenos grupos, provavelmente nus, vivendo em cabanas e limpando terras. Isso mostra que os povos antigos viviam em sociedades urbanas complexas”, diz o coautor Antoine Dorison.
Arqueólogos Rostain e Dorison apresentaram em Paris suas descobertas de urbes na Amazônia |
“É o local mais antigo que conhecemos na Amazônia”, explicou o professor Rostain. “Isso mostra que temos que mudar a nossa ideia do que são cultura e civilização” na região amazônica.
Os arqueólogos fizeram um levantamento de uma área de 300 quilômetros quadrados usando sensores a laser com tecnologia LiDAR.
Assim identificaram 6.000 plataformas retangulares de 20 m por 10 m e 2-3 m de altura, organizadas em grupos de três a seis unidades em torno de uma praça com plataforma central.
Eles acreditam que muitas eram casas, e outras tinham fins cerimoniais. O complexo de Kilamope incluía uma plataforma de 140m por 40m.
As construções foram feitas cortando colinas e criando uma plataforma de terra no topo. Uma rede de estradas e trilhas retas conectava muitas plataformas, incluindo uma que se estendia por 25 quilômetros.
O Dr. Dorison disse que esses caminhos foram a parte mais surpreendente da pesquisa. “A rede rodoviária é muito sofisticada. Estende-se por uma grande distância, tudo está conectado. E há ângulos retos, o que impressiona”, afirma.
Há milenios, civilizações domesticaram a selva amazônica |
As maiores estradas tinham 10 metros de largura e se estendiam por 10 a 20 quilômetros.
Os cientistas também identificaram calçadas com valas em ambos os lados, que acreditam serem canais que ajudavam a gerir a água abundante da região.
Havia sinais de ameaças às cidades: algumas valas bloqueavam as entradas dos assentamentos e podem ser indícios de que houve temores dos povos vizinhos.
Os pesquisadores encontraram pela primeira vez evidências de uma cidade na década de 1970. Mas este é o primeiro estudo abrangente concluído após 25 anos de pesquisa.
O estudo revela uma sociedade grande e complexa que parece ser ainda maior do que as sociedades maias do México e da América Central.
“Imagine se descobrissem outra civilização como a maia, mas com arquitetura, uso do solo e cerâmica completamente diferentes”, indagou o professor José Iriarte.
Algumas descobertas são “únicas” na América do Sul, explicou, destacando as plataformas octogonais e retangulares dispostas juntas.
Nas plataformas foram encontradas covas e casas, além de potes, pedras para moer plantas e sementes queimadas. Mas, não se sabe muito sobre as pessoas que viviam lá e como eram as suas sociedades.
O professor Rostain diz que no início de sua carreira os cientistas acreditavam que nenhum grupo civilizado havia vivido na Amazônia e que talvez não valesse a pena fazer a pesquisa.
“Mas sou muito teimoso, e agora estou muito feliz por ter feito uma descoberta tão grande”, afirma.
Mudança radical no conceito das populações amazônicas não eram selvagens nus, mas civilizados vivendo em urbes |
A ideia de que a Amazônia era pouco habitada antes da chegada dos europeus cai cada vez mais por terra comentou “Climatempo”.
A série de estradas enterradas e montes trabalhados de terra no Equador notada pela primeira vez pelo arqueólogo Stéphen Rostain, “era um vale perdido de cidades”, afirmou ele. “É incrível”.
Os assentamentos no Vale do Upano, foram ocupados num período mais ou menos contemporâneo ao Império Romano na Europa.
As cidades eram intercaladas por campos agrícolas retangulares e cercadas por terraços nas encostas, onde os habitantes plantavam diferentes itens, como milho, mandioca e batata doce – encontrados em escavações anteriores na região.
A área fica à sombra de um vulcão que possibilitou solos ricos para agricultura – mas que também pode ter destruido a sociedade.
Os povos Kilamope e Upano provavelmente se concentravam na agricultura.
“Estamos falando de urbanismo”, afirma o coautor do estudo Fernando Mejía, arqueólogo da Pontifícia Universidade Católica do Equador.
Embora seja difícil estimar as populações, o local abrigava pelo menos 10 mil habitantes, possivelmente até 15 mil ou 30 mil em seu auge, segundo o arqueólogo Antoine Dorison, número comparável à população estimada de Londres na era romana.
Infraestrutura agrícola bem organizada aproveitada até hoje |
A nova descoberta no Equador foi possível graças a uma tecnologia de mapeamento chamada LiDAR. Ela permite que os pesquisadores vejam através da cobertura florestal e reconstruam os antigos locais abaixo dela.
“[Lidar] está revolucionando nossa compreensão da Amazônia nos tempos pré-colombianos”, explicou Carla Jaimes Betancourt, arqueóloga da Universidade de Bonn, na Alemanha, que não participou do estudo.
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